Desde que ganhei uma tornozeleira de presente, não me sai da cabeça a primeira imagem de felicidade que compus sem querer do que seria a maternidade.
Quando estava grávida rolava pela casa um encarte da coleção de verão de uma loja de roupas onde um casal jovem, lindo e sorridente desfilava roupas fresquinhas numa praia em Jericoacoara. Com eles, um menininho de um ano e pouco, loirinho e sem blusa. Daí era o casal namorando deitado na canga, o neném brincando ao lado, mamãe e bebê na rede, papai olhando o horizonte e outras variações do tema. Ao redor da tornozeleira que a modelo ostentava nas fotos, inventei um idílio: pular o primeiro ano de golfadas e noites em branco para cair direto em sermos jovens, lindos e loiros na praia, felizes para sempre.
Veio a pré-eclâmpsia, bebês prematuros, uma ansiedade sobre a vida dos meus filhos que talvez seja o perfeito antônimo de um fim de tarde na praia. Uma mudança de país, muitas descobertas, muitas viagens pelo mundo. Minha relação com os meninos passou por uma barra pesada justo quando eles tinham pouco mais do que a idade do loirinho dos meus sonhos. Minha relação com meu companheiro mudou em vários sentidos, com momentos de cumplicidade e de paz e outros em que nem tanto.
Foram poucas, pouquíssimas tardes preguiçosas na praia nos onze anos que seguiram eu e meu barrigão lendo um encarte publicitário na sala de casa. Sem ninguém prever, desenhar ou adivinhar, viramos uma gangue bem urbana. Vimos juntos mais museus que peixinhos, mais filmes que pores-do-sol, nossos pés pisaram mais metrôs que areia de praia. Agora uma pulseirinha ao redor do meu tornozelo me lembra disso todos os dias.
Quem define nossos sonhos, quem caminha nossa vida, quem decide, meu deus, quem é que a gente vira nessa vida. Quem é que escolhe esses nossos caminhos. Quando a gente viu, já foi.